Recursos pedagógicos para a educação ambiental nos anos iniciais do ensino fundamental: O cinema como instrumento de aprendizagem

 

Luciano Tadeu Corrêa Medeiros

[email protected]

André Luiz Almeida Barros

[email protected]

Sidney Alexandre da Silva Conceição

[email protected]

Maria Ludetana Araújo

[email protected]

Universidade Federal do Pará – UFPA, Brasil

 

 

RESUMO

Este artigo buscou analisar de que forma o uso do cinema pode contribuir com a aquisição de aprendizados sobre a Educação Ambiental e qual o resultado que o uso desse recurso pode proporcionar para o ensino desses saberes nos anos iniciais do Ensino Fundamental. O trabalho tem como base a abordagem qualitativa e, para o seu desenvolvimento, foi realizada uma pesquisa bibliográfica dos autores Guimarães e Rodrigues (2001), Medina e Santos (2001). Rodrigues (2004, 2005), Scardua (2009), Vieira e Rosso (2018) que tratam do tema Educação Ambiental e outros autores que trabalham temas relacionados à Educação. Também foram desenvolvidas duas intervenções em duas escolas da rede pública da área urbana de Belém – capital do estado do Pará, na região Norte do Brasil – no primeiro semestre do ano de 2018, onde foram utilizados os recursos do cinema para o desenvolvimento dessas atividades. Os resultados apontam que o cinema é um instrumento de ampla aceitação por parte dos alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, visto ser uma atividade lúdica apropriada para diferentes faixas etárias. Dessa forma, indicam uma facilidade de interpretação da linguagem do cinema pelos educandos, o que contribui para o êxito na aquisição de conceitos sobre a Educação Ambiental e o aprendizado dos saberes ensinados com a utilização desses recursos.

Palabras clave: Educação Ambiental; Cinema; Práticas Pedagógicas.

 


Pedagogical resources for environmental education in the first years of elementary school: Cinema as a learning instrument

 

ABSTRACT

This article sought to analyze how the use of cinema can contribute to the acquisition of learning about Environmental Education and what the result that the use of this resource can provide for the teaching of this knowledge in the early years of Elementary School. The work is based on a qualitative approach and, for its development, a bibliographic search by the authors Guimarães and Rodrigues (2001), Medina and Santos (2001). Rodrigues (2004, 2005), Scardua (2009), Vieira and Rosso (2018) who deal with the theme of Environmental Education and other authors who work on issues related to Education. Two interventions were also carried out in two public schools in the urban area of ​​Belém - the capital of the state of Pará, in the northern region of Brazil - in the first half of 2018, where cinema resources were used to develop these activities. The results show that cinema is an instrument widely accepted by students in the early years of elementary school, as it is a playful activity appropriate for different age groups. Thus, they indicate ease of interpretation of the language of cinema by students, which contributes to the success in the acquisition of concepts about Environmental Education and the learning of the knowledge taught with the use of these resources.

Keywords: Environmental Education; Cinema; Pedagogical Practices.

 

 

            Artículo recibido: 07 ene. 2021

Aceptado para publicación: 20 ene. 2021

Correspondencia [email protected]

    Conflictos de Interés: Ninguna que declarar

 


 

Recursos pedagógicos para la educación ambiental en los primeros años de educación primaria: El cine como instrumento de aprendizaje

 

RESUMEN

Este artículo buscó analizar cómo el uso del cine puede contribuir a la adquisición de aprendizajes sobre Educación Ambiental y cuál es el resultado que el uso de este recurso puede brindar para la enseñanza de estos conocimientos en los primeros años de la Educación Primaria. El trabajo se basa en un enfoque cualitativo y, para su desarrollo, se realizó una búsqueda bibliográfica de los autores Guimarães y Rodrigues (2001), Medina y Santos (2001). Rodrigues (2004, 2005), Scardua (2009), Vieira y Rosso (2018) que abordan el tema Educación ambiental y otros autores que trabajan en temas relacionados con la Educación. También se llevaron a cabo dos intervenciones en dos escuelas públicas del área urbana de Belém -capital del estado de Pará, en la región norte de Brasil- en el primer semestre de 2018, donde se utilizaron recursos cinematográficos para desarrollar estas actividades. Los resultados muestran que el cine es un instrumento ampliamente aceptado por los estudiantes en los primeros años de la escuela primaria, ya que es una actividad lúdica apropiada para diferentes grupos de edad. Así, indican una facilidad de interpretación del lenguaje del cine por parte de los estudiantes, lo que contribuye al éxito en la adquisición de conceptos sobre Educación Ambiental y el aprendizaje de los conocimientos enseñados con el uso de estos recursos.

Palabras clave: Educación Ambiental; Cine; Prácticas Pedagógicas.

 

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1. INTRODUÇÃO

Conhecer o ambiente em que vivemos é essencial para compreendermos alguns fatores importantes sobre as relações que se estabelecem entre o homem e o meio em que ele vive (Guimarães, 2005). Na atualidade, o diálogo sobre a dinâmica dessas relações tem estado em evidência em todos os segmentos e esferas sociais em que há a necessidade de compreensão da responsabilidade atribuída aos sujeitos sobre as questões ambientais que o envolvem (Loureiro, & Layrargues, 2013). Assim, a escola tem sido uma das principais instituições responsáveis por trazer essa discussão como projeto de Educação Ambiental, para que, desde os primeiros momentos da escolarização, os sujeitos não sejam estimulados a compreender apenas o seu meio e suas relações com ele, mas também da necessidade do cuidado com a preservação e conservação do ambiente (Guimarães, 2005), para que este seja sempre um ambiente adequado a vida e a existência humana, estabelecendo, então, uma relação de harmonia e respeito com este ambiente (Loureiro, & Layrargues, 2013).

Conforme já alertados por Adorno (1995), a Educação não pode formar sujeitos promotores de violência, como percebemos em situações já registradas na história da humanidade, como foi o caso de Auschwitz onde o autor alerta que a educação falhou nesse sentido, pois, ao contrário de formar sujeitos capazes de compreender o respeito necessário que se deve ter à vida, projetou humanos não apenas dispostos a promover um dos maiores cenários de horror que se registrou na memória da humanidade, mas convictos em acreditar em um propósito de violência contra essa humanidade, sem que sua consciência acusasse tal ato como desumano. A escola como instituição responsável pelo ensino sistematizado dos saberes historicamente construídos deve se atentar para uma educação significativa, onde se proponha aos alunos uma formação emancipadora e libertadora (Libâneo, 2013), que possibilite a esses educandos uma consciência de coletividade e democracia, pois, compreendemos que a humanização dos sujeitos se proporciona através da educação (Adorno, 1995), que acontece de forma coletiva dentro dos espaços dos ambientes por eles ocupados, compreendendo de que forma se estabelece a relação dos sujeitos com o espaço, essencial em um projeto educativo efetivado pelas escolas (Guimarães, 2005).

Com essa finalidade, a Educação Ambiental passa a estar presente nos currículos escolares da Educação Básica de forma transversal (Brasil, 1996), porém, é necessário que o ensino desses saberes apresente algum resultado positivo na formação desses alunos, e a aplicação de projetos escolares onde haja intervenções com esse foco deve fazer parte da agenda das escolas, em especial as da rede pública, por se reconhecer que essas são a representação maior da democratização do ensino e também grande responsável pela propagação dos saberes científicos elaborados historicamente (Libâneo, 2013).

Considerando a necessidade de se propor uma Educação Ambiental no Ensino Fundamental das Escolas Públicas, objetivamos analisar a execução de um projeto aplicado em duas escolas da rede municipal de ensino, Terezinha Souza e Inês Maroja, ambas localizadas na região urbana de Belém, capital do Estado do Pará, na região Norte do Brasil, que tinham como finalidade a Educação Ambiental dos alunos dos anos iniciais – 4º e 5º ano – do Ensino Fundamental, utilizando como instrumento pedagógico o cinema, visto esse ser um recurso que faz parte do universo lúdico não apenas das crianças, mas também de adolescentes.

A consciência ambiental é parte do saber necessário para o desenvolvimento e formação do aluno (Brasil, 1996), pois, esse deve aprender a relacionar-se com o ambiente do qual faz parte e adquirir consciência da relação que envolve o coletivo no espaço onde ele se encontra (Guimarães, 2005). Para desenvolver tal consciência, é preciso que a escola busque envolver esses alunos em atividades pedagógicas que objetivem despertar nos mesmos, reflexões sobre essas questões (Libâneo, 2013), para, assim, desenvolverem seu potencial crítico e construir conceitos positivos sobre aquilo que envolve o respeito ao ambiente, sujeitos e coletividade, o que se percebe essencial para a consciência de construção, preservação e conservação do Meio Ambiente (Guimarães, 2005).

Importa destacar, portanto, que um dos principais quesitos na proposição do ensino sobre Educação Ambiental na Escola é a aplicação de atividades e a utilização apropriada de recursos pedagógicos com essa finalidade (Libâneo, 2013), pois, percebemos que nas escolas há uma forte tendência de se compreender a Educação Ambiental como algo que está ligado apenas à preservação de florestas ou de um espaço natural específico (Guimarães, 2005). Porém, compreendemos que, para além desses conceitos que tendem a minimizar o real conceito de Educação Ambiental, deve-se educar os alunos para compreenderem o meio ambiente e a necessidade de reflexão sobre todas as questões que a ele estão relacionadas (Loureiro, & Layrargues, 2013), e isso requer domínio não apenas desses conceitos, mas das práticas pedagógicas e da utilização instrumental por parte dos educadores (Libâneo, 2013) para a Educação Ambiental dos alunos.

Compreendemos que, na Educação Básica, há uma infinidade de metodologias e instrumentos para a Educação Ambiental dos alunos, onde pesa a criatividade do educador que busca essa finalidade (Scardua, 2009), mas a utilização de métodos e instrumentos não muito convencionais, porém, criativos e também atrativos, pode dinamizar o aprendizado e o estímulo a reflexão dos alunos sobre questões ligadas ao Meio Ambiente (Loureiro, & Layrargues, 2013). Assim, entendemos que a ludicidade se mostra como um fator importante no momento de selecionar os recursos pedagógicos para a Educação Ambiental dos alunos desse nível da educação escolar (Medina, & Santos, 2001), por isso, para que possamos desenvolver nossas análises sobre essas questões, deixamos o seguinte questionamento: há um resultado positivo no uso do cinema para a Educação Ambiental dos alunos da Educação Básica?

2. REFERENCIAL TEÓRICO

Para que possamos educar os sujeitos sobre as questões ambientais que a eles estão relacionadas, convém ressaltar que “Educação é atualização histórica de cada indivíduo [...]” (Paro, 1998, n.p.) e, ainda, quando nos referimos ao modelo de Educação proposto pela escola, importa considerar que a escola “[...] é o local onde se dá a educação sistematizada objetivando prover o indivíduo de elementos culturais necessário para viver em sociedade.” (Paro, 1998, n.p.). Por isso, compreendemos o importante papel da escola na Educação dos sujeitos a partir de seu modelo e de seus projetos educativos, pois, segundo Saviani (1985, p. 28) “não é suficiente à existência do saber sistematizado. É necessário convertê-lo em saber escolar, isto é, dosá-lo e sequenciá-lo para efeito do processo de transmissão-assimilação no espaço e tempo escolares.”

Os saberes escolares são necessários para a formação e desenvolvimento dos sujeitos, e, através dos mesmos, convém ensiná-los a saber lidar com suas realidades e refletir sobre elas, pois, compreendemos ser papel fundamental desse modelo educativo, que historicamente foi formalizado para esse fim (Libâneo, 2013), além de reconhecer que a relação entre o ser humano e seu meio é essencial para que os sujeitos possam refletir sobre seu papel diante do mundo, sua natureza e seu desenvolvimento.

Neste contexto entra a Educação Ambiental (EA), com a difícil tarefa de reverter o pensamento ainda corrente, com o intuito de ensinar às atuais e próximas gerações a importância do meio ambiente. A EA é um processo contínuo de aprendizagem voltado para a melhoria da qualidade de vida, onde se aprende a lidar com o meio ambiente respeitando-o e a si próprio (Scardua, 2009, p. 58)

A Educação Ambiental é um campo de conhecimento em construção (Guimarães, & Rodrigues, 2001) e, como saber escolar, também precisa de um projeto educativo desenvolvido a partir dessas perspectivas, intentando dar a oportunidade de o aluno refletir sobre seu meio de forma crítica (Libâneo, 2013). Nessa perspectiva, para Vieira e Rosso (2011, p. 562). “A percepção do problema ambiental e de suas possíveis formas de resolução pode e deve ser tomada pelos próprios alunos, permitindo-lhes que se tornem independentes e críticos, para serem agentes transformadores do seu ambiente”. Reconhecemos, portanto, o papel fundamental do educador com suas reflexões sobre o meio ambiente (Guimarâes, & Rodrigues, 2001), em suas proposições para o estímulo à reflexão do aluno na efetivação do pensar crítico e autônomo a partir do seu fazer docente que deve estar sempre voltado a contribuir diretamente de forma positiva com a educação dos sujeitos que se pretende formar (Libâneo, 2013). Bissoli (2014, p. 588) afirma que: 

Como o trabalho pedagógico intervém na formação das capacidades especificamente humanas em cada criança de que cuidamos e a quem educamos. Afinal, o fazer docente interfere – tenhamos consciência disso ou não – no desenvolvimento da personalidade infantil, que torna cada menino ou menina um indivíduo único e irrepetível, e das forças intelectuais e práticas essenciais à sua vida presente e futura.

Compreendemos que a Educação Ambiental também objetiva interligar o sujeito, suas vivências e realidades ao saber elaborado e seu aprendizado sistematizado proposto pelas escolas para os educandos (Guimarães, 2005), porém, ela não deve ignorar os saberes prévios dos alunos, embora saibamos que, para a educação nesses moldes e com essa finalidade, é necessário que a escola busque possibilitar ao aluno “[...] o ingresso e o domínio da cultura letrada, sem se desviar do seu papel fundamental, que é a difusão do saber sistematizado, isto é, de caráter científico, velando para que este não se perca no interior das escolas em um sem-número de atividades acessórias” (Saviani, 1985, p. 28). Entretanto, reconhecemos que educar os alunos sobre questões ligadas ao Meio Ambiente é um processo muito mais amplo e complexo (Guimarães, 2005). De acordo com a Política Nacional de Educação Ambiental, podemos defini-la como: [...] processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. (Brasil, 1999, n.p.).

Vale ressaltar que “[...] somente quando os problemas ambientais começaram a incomodar, mostrando as consequências de um uso inadequado, que se começou a pensar na necessidade de uma educação voltada para conhecer e ao menos minimizar tais problemas” (Scardua, 2009, p. 59), portanto, entende-se que a Educação Ambiental proposta pela escola deve priorizar a sistematização dos saberes elaborados, convertendo-os em saber escolar, mas considerando o ensino, sobretudo, daquilo que se refere aos ambientes relacionados à realidade e à experiência dos sujeitos com o meio (Guimarães, 2005), seja ele natural e até mesmo os espaços que já tenham sido modificados pela ação do próprio ser humano, os espaços onde o sujeito esteja presente vivendo individualmente ou em coletividade. Vale ressaltar que o recurso pedagógico é importante no momento de se tratar as questões ambientais, sendo os recursos audiovisuais importantes instrumentos na busca dessa finalidade, pois, segundo nos afirma Vieira e Rosso (2011, p. 562), “Por meio do conteúdo dos filmes de impacto ambiental, podemos adentrar aos problemas ambientais presentes em suas narrativas”.

Por se tratar de um instrumento que está ligado diretamente ao universo lúdico, o cinema pode ser considerado um grande aliado do educador ambiental, pois ele pode transportar o aluno para situações que não seriam possíveis, ressignificando tempo e espaço apenas no interior da sala de aula, mas desenvolvendo condições capazes de despertar no aluno a reflexão da sua própria realidade (Guimarães, 2005). Em situações que se assemelham a suas vivências cotidianas, a partir do desenvolvimento da imaginação do aluno, “O cinema de impacto ambiental pode apresentar informações que despertem o interesse dos alunos e permitem a tomada de atitudes que provoquem a transformação ambiental na sua própria realidade” (Vieira, & Rosso, 2011, p. 562).

Contudo, é importante considerar que as atividades e conteúdos apresentados às crianças – alunos e alunas da Educação Básica – tragam significados dentro do universo de suas próprias realidades (Guimarães, 2005), pois, entendemos que, de acordo com Bissoli (2014, p. 589), “Quando a criança está envolvida em fazeres com significado, quando sabe o porquê e o para quê das suas ações e mobiliza-se emocionalmente para alcançar seus objetivos, ela está em atividade, por isso desenvolve de forma plena as suas capacidades [...]”. Portanto, a Educação Ambiental deve apresentar esses significados, sejam em relação aos espaços naturais ou modificados e a relação exercida entre ambos – como é o caso do espaço que compreende as grandes cidades, que, por sua vez, precisam exercer um controle sobre o meio natural, pois é importante compreender a relação entre o espaço natural e o modificado, cujo desequilíbrio, pode ocasionar situações com consequências desastrosas para os dois espaços – principalmente em relação a questões climáticas –, pois esses encontram-se ligados pelo processo natural exercido sobre o planeta, e precisam estar em equilíbrio, visto que, “[...] o homem passou, aos poucos, a entender que existe um retorno de tudo o que ele faz ao meio ambiente [...]” (Scardua, 2009, p. 58). Assim, para que o educando passe a refletir sobre situações ambientais nessa perspectiva, é necessário ainda que ações educativas sejam desenvolvidas, a partir de uma prática pedagógica comprometida com a interação entre esses sujeitos, que não seja de caráter meramente formativo, em formatos, que não permitem a socialização das crianças na construção do diálogo. Guimarães (2007, p. 138-139) assevera que:

O educador ambiental, como uma liderança que pretenda contribuir para a superação dos problemas ambientais, não se contenta em promover intervenções pontuais de caráter meramente informativo, como podem ser tratados os colóquios, as palestras, as capacitações, as exposições, os eventos, as campanhas etc. Esse processo educativo tem que ser potencializador, gerador de movimento, impulsionando o processo de transformação social. Um trabalho processual não é um sequenciamento de intervenções pontuais, principalmente quando estas se dão com a função exclusiva de informar. O educador ambiental que supera essa proposição busca, na compreensão da realidade socioambiental, na percepção do que movimenta a comunidade/sociedades, encontrar os caminhos de intervir.

A aplicação de atividades para a Educação Ambiental dos alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental é uma tarefa que exige um projeto educativo em que a criança seja colocada como sujeito ativo e estimulada a sentir-se pertencente ao meio (Guimarães, 2005) e, ainda, que a mesma seja envolvida diretamente no processo de construção dos valores necessários à compreensão de um ambiente, onde haja reciprocidade de respeito entre os sujeitos e os espaços que compreendem a natureza do mundo (Loureiro, & Layrargues, 2013). Nesse sentido, também é necessário que se permita o protagonismo da criança nessas construções e a possibilidade de que a mesma possa expressar suas reflexões acerca daquilo que está sendo aprendido (Libâneo, 2013; Guimarães, 2005). Segundo afirma Bissoli (2014), podemos entender que: “[...] quando o adulto permite que a criança participe das decisões sobre como expressar aquilo que aprendeu [...] cada tarefa adquire sentido e, pelo envolvimento emocional que permite, contribui para o desenvolvimento das diferentes capacidades da criança” (Bissoli, 2014, p. 589).

Importa destacar que, para aplicar atividades que possam fazer com que o aluno reflita sua relação com o Meio Ambiente e outras questões nesse sentido, “É preciso rever a forma como o homem vem tratando o meio ambiente” (Scardua, 2009, p. 58). Por isso, é essencial que o professor compreenda a necessidade do cuidado com a proposição dos saberes e as metodologias utilizadas para a assimilação dos alunos em meio a sua complexidade (Libâneo, 2013; Guimarães, 2005). De acordo com Saviani, “o saber sistematizado é convertido em saber escolar, tornando-o, pois, transmissível-assimilável na relação professor-aluno.” (Saviani, 1985, p. 28), entretanto, as realidades vivenciadas pelos alunos devem estar presentes e em conectividade com os saberes escolares apresentados aos educandos, pois todo o conjunto de saberes são importantes no seu aprendizado e desenvolvimento. Para Bissoli (2014), nesse processo de desenvolvimento: a criança aprende valores, normas de conduta e capacidades especificamente humanas e tornasse capaz de expressar-se de maneira singular diante do mundo: ela forma uma consciência cada vez mais complexa sobre os objetos e seu conhecimento, sobre as relações humanas e, sobretudo, sobre si mesma (a autoconsciência). Esse processo é mediado pelas situações que a criança vivencia, por isso podemos afirmar que a personalidade de cada um resulta de sua biografia: das suas condições de vida e educação, das atividades que desenvolve, das aprendizagens que empreende e do desenvolvimento do seu psiquismo. (Bissoli, 2014, p. 590).

Desenvolver uma Educação Ambiental nas escolas, é fundamental no processo educativo dos alunos, principalmente quando se trata de crianças em plena atividade de desenvolvimento e em um momento crucial de aquisição de novas informações e novos saberes (Guimarães, 2005). Assim, conforme Scardua (2009) nos afirma, a Educação Ambiental deve ser um projeto educativo presente desde os primeiros momentos da criança na escola.

Assim sendo, o papel da Educação Ambiental é fundamental para trabalhar valores nas crianças que transformem suas atitudes perante o meio ambiente.  E uma boa opção de se começar é implantar a EA na Educação Infantil (EI).  Seguindo a tradição popular, que diz serem as crianças o futuro do país, não se pode deixar de investir nelas. (Scardua, 2009, p. 58).

É importante considerarmos que todo projeto educativo, inclusive os que tenha como foco a Educação Ambiental dos alunos, deve se opor a uma proposta educativa que possa produzir qualquer aspecto que venha desencadear a violência na formação dos sujeitos (Adorno, 1995), principalmente quando se trata de crianças que se encontram em seus primeiros momentos no processo de escolarização. A aprendizagem deve estar direcionada para o respeito ao meio ambiente (Guimarães, 2005) e consequentemente às pessoas, além disso, deve estar pautada em valores essenciais na composição dos sujeitos, sendo uma formação voltada à solidariedade, a coletividade, a democracia e a liberdade (Libâneo, 2013), deve ser formadora de sujeitos no sentido de tornarem estes aptos ao convívio harmônico com o mundo, reflexivos em relação ao que se compreende do mundo, da natureza e seus espaços, sendo que o mundo, como a representação maior do espaço coletivo, deve também ser compreendido por estes sujeitos como espaço comum a todos (Guimarães, 2005). 

3. MÉTODOS

O trabalho traz como base a abordagem qualitativa. Para tanto, foi realizada uma pesquisa bibliográfica de autores que contribuem com a temática Educação Ambiental, para a fundamentação teórica a partir de seus pressupostos. Também foi desenvolvido um trabalho de campo, onde foram realizadas duas atividades sobre o tema Educação Ambiental, em duas escolas da rede pública do município de Belém, capital do Estado do Pará, na região norte do Brasil. A primeira atividade foi aplicada na escola Terezinha Souza – que passamos a identificar como escola “A” – com alunos do 4° ano do Ensino Fundamental/Anos Iniciais, intitulada Cinema para a Preservação e Conservação e a segunda atividade, intitulada Consumo e Mercado Local, foi aplicada na escola Inês Maroja – que identificaremos como escola “B” – com alunos do 5º ano também dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental – Anos Finais, conforme descrito na tabela abaixo.

Tabela 1 - Atividades desenvolvidas nas turmas da educação básica.

Escola

Turma

Nº de alunos

Atividade

A

Terezinha Souza

4° ano.

25

Cinema para a Preservação e Conservação

B

Inês Maroja

5° ano

25

Consumo e Mercado Local

Fonte: Elaborado pelos autores.

As atividades foram realizadas no primeiro semestre do ano de 2018, entre os meses de março e junho, e fizeram parte do projeto Plantando a Brisa do Amanhã, idealizado e desenvolvido pelos alunos, conjuntamente com a docente ministrante do componente curricular eletivo Educação Ambiental, do Curso de Pedagogia da Universidade Federal do Pará – UFPA. O projeto trazia como base, a necessidade de avaliação dos alunos, que seria feita após o encerramento do projeto, em cuja culminância, os mesmos deveriam dividir-se em grupos para desenvolver intervenções sobre Educação Ambiental com alunos da Educação Básica, a partir de temas preestabelecidos pelas escolas.

O texto também foi desenvolvido como forma de avaliação dos graduandos e, como quesito, deveriam ser construídos a partir da experiência vivenciada por meio das intervenções, que deveria trazer análises e observações fundamentadas, do desenvolvimento e dos resultados das atividades aplicadas com os alunos da Educação Básica. As intervenções seriam desenvolvidas durante eventos do calendário de atividades sobre Meio Ambiente promovidos pelas escolas.

Nas duas atividades que destacamos – que são as atividades desenvolvidas pelos alunos do grupo 2 do projeto, cuja composição se refere aos autores deste texto –, foram utilizados os recursos do cinema em sua execução e divididas em quatro momentos pelo grupo executor. No primeiro momento, houve a apresentação do grupo de alunos de graduação em pedagogia, que palestrou sobre questões ambientais e detalhou aos alunos o caminho que seria seguido em cada uma das atividades.

No segundo momento, foram projetados os filmes com os temas sobre o Meio Ambiente, de acordo com o tema proposto pela escola, e, no terceiro momento, os alunos se dividiriam em grupos para poderem desenvolver diálogos entre si, sobre o assunto abordado e no quarto, e, último momento, os grupos deveriam socializar suas reflexões com os demais grupos, tendo como mediadores os palestrantes do grupo de alunos do Curso de Pedagogia.

Durante o desenvolvimento das atividades, também foram feitas observações e transcrições de algumas falas dos alunos no momento de suas reflexões, para compor esse trabalho como base de análise. Compreendemos como fundamentais no trabalho de pesquisa, as observações feitas in lócus, pois, através delas, foi possível coletar informações essenciais da realidade que apresenta no contexto investigado, o que se mostra pertinente nos trabalhos de abordagem qualitativa.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Com a realização de intervenções com alunos de duas Escolas Públicas na área urbana de Belém, capital do Estado do Pará – Norte do Brasil –, buscamos, através do uso do cinema, elaborar atividades de Educação Ambiental para as crianças do Anos Iniciais do Ensino Fundamental, em que pudesse ser dado a elas o protagonismo no momento de se construir os conceitos a partir de suas reflexões sobre os temas que foram abordados nessas atividades, mas sem perder o foco do ensino desses saberes de forma pedagógica (Libâneo, 2013), onde o educador pudesse conduzir as crianças ao pensar e refletir o mundo e o Meio Ambiente de forma mais autônoma (Freire, 1996).

Contudo, percebemos, já no início da realização das atividades, que as escolas onde essas atividades foram aplicadas oferecem, como proposta de Educação Ambiental, apenas alguns momentos em situações específicas do calendário escolar (Guimarães, 2005) e essas propostas educativas, por se tratarem de temas transversais, limitam-se a serem trabalhadas apenas em datas preestabelecidas por esses calendários, pois, segundo relato dos alunos, são temas que não são tratados em outros momentos durante o ano letivo, em nenhuma das disciplinas do currículo, contribuindo dessa maneira para o estado permanente do modelo de educação escolar, sem levar em conta a dinâmica da educação e do mundo.

Nosso mundo não necessita de um sistema educativo orientado para a manutenção do “status quo”, nem de torres de marfim de aprendizagem elitista, mas de ambientes educativos flexíveis e funcionais, onde os jovens e os adultos possam entrar em contato com conceito e ideias relevantes para seu presente e futuro. (Medina, & Santos, 2001, p. 18).

A primeira intervenção foi realizada na escola A com alunos do 4º ano do Ensino Fundamental, e foi intitulada Cinema para a Preservação e Conservação. Tratava-se de uma atividade de diálogo com os alunos, após a apresentação de um filme que trazia como temática a Educação Ambiental, direcionada à preservação e conservação do Meio Ambiente natural, muito explorado e devastado pela ação humana.

Contava a história de um ser mitológico, nativo das florestas e responsável por proteger esse espaço, era humano, mas havia sido agraciado por entidades de um mundo místico, com poderes sobrenaturais para cumprir a missão de proteger o meio ambiente, que se encontrava em perigo de degradação por parte das pessoas, a maioria vinda das grandes cidades para explorar a natureza, fauna e flora, produzindo lixo e poluição, e que não compreendiam a necessidade de respeitar a natureza e suas formas de expressão. O filme induzia a uma reflexão sobre nosso comportamento frente à natureza, o ambiente em que vivemos e nossas relações com esse meio (Guimarães, 2005), o que constituiu um dos objetivos dessa proposta educativa, que considera necessária a mudança no modo de pensar essas questões sobre o mundo. Medina e Santos consideram que:

Necessita-se de uma mudança fundamental na maneira de pensarmos acerca de nós mesmos, nosso meio, nossa sociedade e nosso futuro; uma mudança nos valores e crenças que orientam nosso pensamento e nossas ações; uma mudança que nos permita adquirir uma percepção holística e integral do mundo com uma postura ética, responsável e solidária. (Medina, & Santos, 2001, p. 18).

Na segunda intervenção, intitulada Consumo e Mercado Local, realizada na escola B o filme apresentado foi sobre a produção de lixo das grandes cidades ocasionadas pelo consumo desordenado de produtos de grandes empresas descompromissadas com o meio ambiente, dedicando-se apenas ao lucro financeiro, onde a propaganda bem produzida estimulava crianças e adolescentes para o consumo de produtos supérfluos, cujo descarte após a vida útil do objeto não era de responsabilidade da empresa, pois não haviam leis ambientais que pudessem dar conta de responsabilizá-las. Essas situações estão presentes na vida cotidiana das crianças que vivem nas grandes cidades e, segundo sugere Freire (1996, p. 33), “Por que não aproveitar a experiência que tem de viver em áreas da cidade descuidados pelo poder público para discutir, por exemplo, a poluição dos riachos e dos córregos e os que oferecem a saúde das gentes”.

O contato inicial com os alunos nas duas escolas já demostrou que os mesmos mostraram uma grande satisfação com a presença da equipe que faria a intervenção e aguçou a curiosidade dos mesmos, no sentido de saber o que seriam todos aqueles equipamentos e pessoas, aproximando-se dessa curiosidade no momento de ocupação do espaço por parte da equipe. O estímulo a essa curiosidade é um elemento positivo para a aproximação com o aluno (Freire, 1996) e um ótimo momento para desenvolver o convite para que participem da atividade, que na ocasião foi imediatamente aceita pelos alunos, depois de ser esclarecido que se tratava da exibição de um filme. O cinema mostrou-se um instrumento pedagógico unanimemente aceito pelas crianças do 4º ano da Escola A e também pelas crianças do 5º ano da Escola B.

Na escola A, ao fazermos as apresentações para os alunos do 4º ano e explicarmos o que seria apresentado e como seria a dinâmica da atividade, os alunos mostraram-se entusiasmado, principalmente quando deixados à vontade para fazer o questionamento que quisessem sobre a atividade (Libâneo, 2013). Esse momento foi o de percebermos o quanto é importante deixar que a criança apresente seus saberes sobre o que está sendo proposto como ensinamento, suas liberdades e curiosidades (Freire, 1996), pois, reconhecemos que elas trazem em suas bagagens suas vivências e experimentações com o mundo (Guimarães, 2005) e seus saberes prévios não podem ser descartados como se não representassem seus valores sobre o mundo e sobre aquilo que conhecem do mundo. Como afirma Freire P, “O educador democrático não pode negar-se o dever de, na sua prática docente, reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade, sua insubmissão [...]” (Freire, 1996, p. 28).

A primeira intervenção, realizada na Escola A, possibilitou aos alunos inicialmente refletirem sobre representação, pois, no filme, a personagem central é escolhida para representar a comunidade nativa da floresta, recebendo o poder para tomar decisões que protegessem a floresta e que produzissem benefícios para essa comunidade. Os alunos foram deixados à vontade para refletirem sobre o filme após sua apresentação, sendo apenas separados em grupos de 5, e já com a possibilidade de tomarem decisões, propuseram que um único membro do grupo representasse o mesmo, lhes dando o poder de através de sua fala, ser o responsável por apresentar as reflexões do grupo. Esse potencial reflexivo se mostrou bastante latente entre as crianças, que também conseguiram fazer uma leitura política da situação, comparando a personagem escolhida como representante das comunidades nativas do filme apresentado, com os representantes públicos, responsáveis por tomar as decisões políticas. Guimarães (2004, p. 151) aponta que:

O ambiente educativo construído no cotidiano escolar pode se colocar como um nó em movimento estruturador de uma rede que se constituía, potencialmente, em um espaço comunicacional de participação e a aprendizagem, de debate, reflexão, difusão de informações, em um movimento organizado de relações que gere pressão na ordem conservadora.

Essas reflexões dos alunos, embora tenham adquirido ainda um conceito preciso sobre os representantes político e as esferas de governo, são bastante pertinentes e mostram o quanto a criança dos anos iniciais do Ensino Fundamental já conseguem fazer uma relação a partir do conteúdo fictício dos filmes, com elementos que integram a sua realidade, onde a experiência e a vivência desses alunos se mostram com base para o desenvolvimento dessas reflexões, em que as relações e realidades podem ser comparadas (Guimarães, 2005).

Um outro ponto significativo que consideramos importante trazer é que os alunos conseguiram fazer uma leitura do filme bastante precisa, mas própria da idade em que se encontram – entre 9 e 10 anos –, pois, o representante de um dos grupos se posicionou sobre a personagem central do filme declarando: “A diferença, é que ele é um super-herói e tem superpoderes, mas não existem super-heróis. Quem tem que defender a natureza somos nós!” (Aluno da Escola A, fala transcrita). Essa fala também identifica que o aluno nessa idade também já consegue identificar o que realmente faz parte de sua realidade e o que é irreal (Freire, 1996). Contudo, percebemos que, como se tratam de personagens próximos aos que representam os mitos próprios da região amazônica – como o Curupira e a Iara ou Mãe d’agua –, muito presentes na cultura dessa região, os alunos têm uma certa identificação com esses seres lendários, o que facilita o trabalho de Educação Ambiental desses alunos, através da leitura que conseguem fazer da mensagem expressa no filme, por uma questão de pertencimento, pois, em Belém, os alunos têm uma proximidade com a floresta e regiões mais nativas, visto que a maioria deles têm parentesco com pessoas do interior, o que é muito comum na capital do estado do Pará e outras capitais amazônicas. Isso faz com que esses alunos tenham contato e proximidade com a natureza, suas lendas e seus personagens míticos, pois, os mesmos costumam frequentar as cidades interioranas e áreas praianas das ilhas de Belém, principalmente em período de férias escolares.

Os alunos, ainda, mostraram que, para entenderem a mensagem, de acordo com a leitura do filme, precisam de atenção para que possam interpretar seu conteúdo e a mensagem que ela intenta transmitir como nos relatou um aluno de uma das equipes: “Tio, a gente tem que assistir o filme, que ele vai mostrar alguma coisa pra nós, mas tem que ficar com bem atenção. Esse do índio, tá dizendo que as pessoas da cidade vão pra praia, não, pro igarapé e joga todo o lixo na água, nem respeita” (Aluna B, fala transcrita). E, dando continuidade, o representante do outro grupo complementa: “é, e polui tudo! Ainda pega os animais e leva. Os bichinhos que são do mato tem que ficar no mato, não pode colocar na jaula pra ele ficar preso. E eu vi no jornal que a tartaruga morreu porque comeu a tampa da garrafa de refrigerante que jogaram na água da praia” (Aluno C, fala transcrita).

Os saberes prévios dos alunos se aliam à sua memória reflexiva (Guimarães, 2005), dando significado às informações apresentadas nos filmes e contribuindo para o desenvolvimento de sua personalidade. Bissoli (2014, p. 589) considera que, nesse processo: “[...] memória, atenção, linguagem oral, escrita ou plástica e autocontrole são algumas das funções psíquicas superiores que se fortalecem, interferindo diretamente no desenvolvimento da personalidade”.

Na segunda intervenção, que foi realizada na escola B, os alunos também desenvolveram reflexões bastante pertinentes em relação à mensagem do filme apresentado. Os alunos perceberam que o consumo desordenado de produtos, na maioria das vezes supérfluos, produz uma consequência desastrosa para o meio ambiente, pois o descarte de resíduos provocado pelo crescente consumo de produtos industrializados não é tido como um ponto importante nessa relação de consumo (Loureiro, & Layrargues, 2013), segundo a leitura do filme feita pelos alunos.

Ao contrário da turma do 4º ano da escola A, os alunos do 5º ano da escola B não demonstraram já ter essa informação anteriormente à exibição do filme, esse foi um exercício reflexivo provocado pela mensagem do filme, pois, os mesmos ainda não haviam feito a relação do consumo com a produção de resíduos descartados na natureza e a necessidade de lucro financeiro por parte das indústrias que investem massivamente em propagandas para estimular esse consumo (Loureiro, & Layrargues, 2013). Essa percepção ocorreu pelo fato de um aluno despertar um diálogo com os outros alunos da turma a esse respeito, quando o mesmo declarou: “Ah, é mesmo! Vocês entenderam? Quanto mais refrigerante eu comprar, vai ter mais lixo de garrafa Pet pra poluir a rua. Por isso que tem muito lixo, porque as pessoas compram muitas coisas e depois não presta mais” (Aluno D, fala transcrita). Essa fala foi concluída com o posicionamento de outro aluno, que afirmou: “é mesmo! Eu entendo agora que tem que comprar só o que precisa, por isso que o dono do shopping é rico” (Aluno E, fala transcrita).

Um ponto interessante no diálogo entre os alunos se ocasionou por conta do consumo e da propaganda. No filme, a personagem central não possuía recursos para a aquisição de roupas e tênis da moda, sendo desprezada pelo seu grupo por não estar usando o que a mídia colocava como o produto mais moderno, necessário e bonito para o momento, e que todos estavam usando, acentuando essa pressão para o consumo dos produtos, pois, por onde a personagem passava, havia uma propaganda massiva em todos os lugares e veículos de comunicação desses mesmos produtos. As crianças conseguiram identificar o poder que a mídia tem de estimular o consumo de produtos, muitas vezes desnecessários, e que esse consumo feito de forma desordenada pode agravar a produção de resíduos que são descartados na natureza (Loureiro, & Layrargues, 2013) e, ainda, que os mesmos podem ser substituídos por produtos mais baratos encontrados em comércios do próprio bairro e que são produzidos por pessoas da comunidade. Guimarães (2004, p. 120) pontua que:

Os professores, na maior parte das vezes estão preocupados com a degradação da natureza, mobilizam-se com empenho sincero para enfrentar essa questão, mas as práticas resultantes, geralmente, são pouco eficazes para atuar, de forma significativa, no processo de transformação da realidade mais imediata com a qual estão lidando e, reciprocamente, com uma realidade mais ampla.

Um outro ponto, nesse sentido, que também foi percebido pelos alunos é que a questão do consumo pode produzir outras mazelas sociais, além da poluição (Loureiro, & Layrargues, 2013), pois, os mesmos fizeram essa relação ao perceberem que, no filme, o personagem decide adquirir os produtos por meios ilícitos, furtando e mesmo desenvolvendo alguns assaltos na tentativa de obter o bem de consumo a qualquer custo. Os alunos findaram por reconhecer que essa necessidade de consumo estimulada pela mídia pode criar nos sujeitos uma personalidade nociva, socialmente reprovável e criminosa, gerando um comportamento inadequado e produzindo, com isso, a violência. Um dos alunos declarou que: “a gente não tem que comprar tudo só porque aparece na televisão e todo mundo diz que é bonito. A gente tem que ver que o nosso pai não tem dinheiro pra comprar, tem que comprar comida. Quem rouba é ladrão, é um criminoso” (Aluno F, fala transcrita).

A falta de responsabilidade dessas industrias com o consumo e o descarte de resíduos também foi reconhecida pelos alunos como uma questão política (Loureiro, & Layrargues, 2013), demonstrando mais uma vez que os alunos dessa faixa etária já compreendem que, dentro das suas realidades, há relações estabelecidas entre a sociedade e os representantes políticos, embora, eles ainda não consigam conceituar o significado dessas representações, como podemos perceber na fala de uma aluna: “professor, lá na rua da minha casa tem muito lixo e é tudo cheio de rato, o prefeito não manda limpar. Quando chove o lixo vai tudo para dentro do canal, daí fica tudo entupido” (Aluna G, fala transcrita). Essa declaração da aluna foi essencial para a afirmação de sua colega de classe, que, após sua fala, declarou: “O presidente tem que mandar uma lei pra limpar o lixo, senão ninguém vai obedecer, mas também a gente não pode jogar lixo na rua e sujar tudo” (Aluna H, fala transcrita). Essa fala acabou mostrando a compreensão de que existem situações que são regulamentadas por leis e a compreensão sobre a responsabilidade que cabe ao cidadão, com o descarte de resíduos.

Sobre as intervenções realizadas com a utilização do cinema como instrumento pedagógico, consideramos que o recurso se mostrou extremamente positivo e importa ressaltar que esse – por ser um elemento lúdico que está presente no universo não apenas de crianças, mas também de adolescentes, jovens e adultos – proporciona um aprendizado prazeroso para os educandos, principalmente sobre ensinamentos relacionados a questões ambientais, que são temas transversais do ensinamento escolar e não são tratados cotidianamente. Convém destacar também que, para que haja um resultado positivo em sua utilização, é preciso que ele não perca seu caráter pedagógico (Libâneo, 2013) e o professor também não abra mão da intencionalidade no uso desse recurso, visto que a ludicidade não pode ser apresentada na educação escolar sem que haja objetivo centrado no desenvolvimento da criança, haja vista serem essenciais no desenvolvimento infantil e nas atividades escolares propostas para esse desenvolvimento.

5.  CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscar elementos que contribuam com a prática pedagógica é um desafio constante à criatividade de professores e educadores que intentam estimular o aprendizado dos alunos sem cair, no entanto, nas armadilhas nocivas da docência. Utilizar o cinema, embora tenha sido um grande desafio, contribuiu de forma bastante expressiva para aproximar os alunos dos Anos Iniciais, aos problemas ambientais cotidianos vivenciados pelas crianças e que as vezes não são percebidos por elas, o que é de grande valia para que esses sujeitos se tornem seres autônomos, críticos e reflexivos do seu meio, pois o objetivo de educar é formar os sujeitos de acordo com as perspectivas que construímos, principalmente aquelas voltadas para a formação da integridade moral, caráter humano e cidadania, onde descartamos as potenciais possibilidades  que venham contribuir para que esses sujeitos se tornem nocivos, não apenas à sociedade e ao convívio social, mas também à humanidade e às relações por ela estabelecidas.

Ao considerarmos essa reflexão, percebemos a dimensão da responsabilidade de se propor uma educação voltada para o respeito à vida e às liberdades, que se preocupe com a formação do sujeito nessa perspectiva, considerando que essa educação deva estimular os alunos a exercerem seu potencial crítico e reflexivo sobre suas realidades e relações com o mundo e com os outros, permitindo assim, que essas relações possam ser compreendidas e questionadas. Essa, portanto, deve ser a dimensão pretendida por todo e qualquer modelo de educação, principalmente no que se refere à Educação formal ofertada pelas escolas, em que as relações de ensino e aprendizagem tendem a ganhar contexto de mercado e se direcionar para a manutenção do sistema capitalista, retirando de sua intenção formar um sujeito crítico e reflexivo, que questione esse sistema. Essa educação não deve se voltar para servir o mercado, colocando os sujeitos como mera necessidade de mão de obra produzida para dar sustentação ao sistema capitalista, que retira dos sujeitos a possibilidade de serem livres do seu controle, tornando-se, para os mesmos seu opressor, o que explicitamente se torna uma violência implícita em meio a esse sistema que tem, por tendência, camuflar essa realidade.

Os projetos educativos escolares devem ser direcionados a formar um sujeito para a solidariedade, para a liberdade, para o respeito a vida, para a ciência, para a compreensão reflexiva do mundo e de suas relações com o mundo e sua natureza, oportunizando e fomentando o potencial crítico das crianças sobre seu meio, sua realidade e sua condição humana. A escola não pode sonegar ao aluno o direito de aprender, e esse aprender não deve ser pautado na mera transmissão de conteúdos, que em muitas ocasiões tendem a ser opressores pelo caráter impositivo com que são ministrados, ao contrário, que seja libertador, que coloque o sujeito em igualdade de consciência, pois, os saberes produzidos pela humanidade são patrimônio dela, não devendo, portanto, ser promotores da segregação dos educandos, impedindo que esses tenham acesso ao ensino dos mesmos, pois estes são parte do mundo e precisam estar em harmonia com esse mundo, mas como compreender essa relação senão pela educação e pela escola, onde são propostos e divulgados os saberes sobre esse mundo que foram produzidos historicamente pela humanidade.

As crianças do Ensino Fundamental precisam ser ensinadas a compreenderem o mundo, a natureza e as elações que os envolvem, e a escola não pode se opor a isso, deve, a vista disso, buscar encontrar como recursos de aprendizagem, os mecanismos e os instrumentos necessários para que ao aluno possa ser possibilitado o exercício do direito de ter esses ensinamentos, e, utilizar o cinema, mostrou-se um excelente recurso pedagógico para esse fim, principalmente porquê ele provoca o imaginário da criança e isso é essencial para sua reflexão e para a formação de uma consciência crítica, portanto, apresenta-se como um instrumento importante para auxiliar a educação das crianças,  sobretudo em relação a questões ambientais e com alunos dos Anos Iniciais do Ensino fundamental.

6. LISTA DE REFERÊNCIAS

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Bissoli, M. F. (2014). Desenvolvimento da personalidade da criança: o papel da educação infantil. Psicologia em estudo, 19(4): 587-597.

Freire, P. (1996) Pedagogia da autonomia: saberes necessários a prática educativa. 31. ed. São Paulo: Paz a terra.

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Libâneo, J. C. (2013). Didática. 2. ed. São Paulo: Cortez.

Loureiro, C. F. B., & Layrargues, P. P. (2013). Ecologia política, justiça e educação ambiental crítica: Perspectivas de aliança contra-hegemônica. Trabalho, educação, saúde, 11(1): 53-71.

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