A formaqáo docente e a educaqáo no campo: da teoria á
prática educativa

 

Auricélio Dos Santos Feitos

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INTRODUQÁO

Tudo passa e tudo fica

porém o nosso é passar,

passar fazendo caminhos caminos

 sobre o mar

(Antonio Machado[1])

Nas contradices do real em movimento é preciso considerar as mudanzas e as permanencias de qualquer processo social. Como na poesía de Machado, ao mesmo tempo em que tudo passa, tudo também fica. Em outras palavras, na mudanza residem as permanencias e essas trazem consigo um que de transitoriedade. Assim, o que é hoje se constituiu daquilo que era ontem e tem em si mesmo a potencialidade de ser (trans)formado amanha.

Diante da sociedade capitalista marcada pelo acúmulo do lucro desigual que leva o sistema á autodestruigao (MéSZAROS, 2000), a educagao pode servir como caminho de reprodugao ou emancipagao dos sujeitos. Todos os processos sociais encontram na educagao a mola propulsora que tem em si a potencialidade de fortalecer caminhos opressores ou permitir a construgao da libertagao dos sujeitos em constituigao através do conhecimento (FREIRE, 1996).

Em meio á tessitura do indivíduo no bojo da sociedade pelas vias do conhecimento, a formagao do ser humano e de todos os profissionais toma a centralidade dos processos, sobretudo, na área de educagao. Sendo assim, “a educagao constitui um ato instrutivo e formador entre sujeitos, de modo que a gestao da matéria, em contexto situado, permeada pela autonomia relativa do profissional de ensino, adquire conotagao moral e ética” (THERRIEN, 2006, p. 74). Assim, todos os atores do cenário da educagao que se manifestam no palco da escola, da sala de aula e da comunidade ao seu redor, sao fundamentais na formagao de sujeitos autónomos á sombra da moral e do exercício da cidadania. Quando falamos de uma educagao que liberta, nos moldes defendidos por Paulo Freire, nao nos referimos apenas áquela que se dá em espatos formáis de ensino nas grandes cidades. É de suma importancia que o Estado invista em projetos ligados á educagao no campo.

Defendemos aqui uma formagao docente que considere a importancia da práxis gramsciana, nao sendo reduzida nem a uma formagao meramente pragmática, com foco exclusivo no praticismo, muito menos a uma formagao exclusivamente teórica, que nao considere os contextos reais de ensino. Portanto, buscamos fazer um estudo da formagao continuada de professores que lecionam em escolas do campo e como essas formagoes consideram a relagao teoria-prática.

Acreditamos ser importante ter em mente tres ideias:

1.    O campo no Brasil está em movimento. Há tensoes, lutas sociais,

organizagoes e movimentos de trabalhadores e trabalhadoras da terra que estao mudando o jeito da sociedade olhar para o campo e seus sujeitos;

2.    A Educagao Básica do Campo está sendo produzida neste movimento, nesta dinamica social, que é também um movimento sociocultural de humanizagao das pessoas que dele participam;

3.    Existe uma nova prática de escola que está sendo gestada neste movimento.

Nossa sensibilidade de educadores já nos permitiu perceber que existe algo diferente e que pode ser uma alternativa em nosso horizonte de trabalhador da educagao, de ser humano. Precisamos aprender a potencializar os elementos presentes nas diversas experiencias, e transformá-los em um movimento consciente de construgao das escolas do campo como escolas que ajudem neste processo mais amplo de humanizagao, e de reafirmagao dos povos do campo como sujeitos de seu próprio destino, de sua própria história.

Vale ressaltar que este trabalho utilizou-se das propostas presentes na obra “Escola da Terra no Ceará: conhecimentos formativos para a práxis docente do/no campo”. Como já salientado por nós em parágrafos anteriores, nossa proposta de formagao vai muito além formagao meramente pragmática. Defendemos a aproximagao entre a universidade e a sociedade, valorizando, principalmente, os profissionais que atuam na educagao básica brasileira.

Ao falarmos que a escola é fundamental na formagao de sujeitos autónomos á sombra da moral e do exercício da cidadania, vamos ao encontro da proposta da Escola da Terra, uma vez que ela se situa no bojo das agoes de resistencia, de luta pela garantia do direito á educagao e outros direitos sociais, conquistados com muita luta ao longo da história do Brasil.

Este trabalho está dividido em cinco partes que, embora tratem de pontos

diferentes do trabalho, complementam-se, resultando em um todo unitário. O próximo

item traz a nossa fundamentagao teórica, coerente com a proposta de formagao da Escola da Terra. O terceiro item trata da metodologia utilizada na pesquisa, dando enfoque á aplicagao de um questionário. O quarto item aborda os dados coletados e suas análises, á luz do nosso referencial teórico. O quinto e último item é composto pelas considerares finais.

 

 

 

 

Artículo recibido: 03 nov. 2020

Aceptado para publicación: 20 dic. 2020

Correspondencia [email protected]

    Conflictos de Interés: Ninguna que declarar


 

FUNDAMENTADO TEÓRICA

No bojo da sociedade pós-moderna e das aspiragoes da ciencia, atualmente, a dicotomizacao da relacao teoria com a prática encontra seu nascedouro no mundo greco-romano dos homens que pensavam em oposigao aos homens que faziam (VÁSQUEZ, 2011)[2]. Esta concepgao de mundo se desenvolveu na história das ciencias experimentais no contexto da modernidade á sombra do paradigma positivista que propoe a neutralidade da relagao sujeito-objeto, obscurecendo as questoes de poder que costuram os tecidos sociais. Esse desvelamento foi discutido mais tarde através das teorias críticas que propoem um outro paradigma que mais adequadamente explica as contradigoes do real e introduz na ciencia a politicidade que a funda enquanto caminho marcado pelas intencionalidades na produgao do conhecimento (ALVES-MAZZOTI, 1996).

Na tentativa de aproximar o que a ciencia moderna distanciou, acreditamos que “o objetivo das teorias é compreender e explicar os fenómenos de uma forma mais ampla, através da reconstrugao conceitual das estruturas objetivas dos mesmos. [Por isso...] Concluindo, a teoria nao é uma mera descrigao da realidade, mas uma abstragao” (LAKATOS; MARCONI, 2003, p. 123-24). Neste sentido, a teoria serve para compreender os fenómenos naturais e sociais partindo das contradigoes da concretude em busca de explicar as relagoes entre o sujeito cognoscente e o objeto cognoscível na diregao da construgao do conhecimento que humaniza (FREIRE, 1996; BRAGA, 2012; VIEIRA, 2015).

Partindo destas premissas de articulagao entre a teoría e a prática, buscamos nos aproximar das discussoes teóricas do chao da sala de aula. Entendemos que a “[...] boa teoria é aquela que, por sua vez, foi construída em sólidas bases empíricas” (PIMENTA, 2008, p. 21). Além do mais, desejamos trilhar caminhos rupturantes com senso comum instaurado e perceptível na fala de alguns professores que dizem que na teoría é tudo muito bonito, mas na prática a realidade é outra! Entretanto, partimos do princípio de que “[...] o problema consiste na discrepancia entre a prática e a teoria que orienta a prática. E os desajustes se resolvem modificando a teoria, nao a realidade” (PIMENTA, 2008, p. 65). Em suma, se uma proposta teórica nao está dando conta de nos ajudar a compreender e explicar o real, a questao nao está em modificar o real, mas, sim, em modificar a teoria.

Segundo a Lei de diretrizes e bases da educagao nacional (LDBEN),

O ensino fundamental obrigatório, com duragao de nove anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos seis anos de idade, terá por objetivo a formacao básica do cidadao, mediante: I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; II - a compreensao do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisicao de conhecimentos e habilidades e a formacao de atitudes e valores; IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos lacos de solidariedade humana e de tolerancia recíproca em que se assenta a vida social (BRASIL, 2010, art. 32)

Mediante as proposicoes da LDBEN, é possível inferir algumas questoes pedagógicas de forma simétrica. Primeiro, a partir dos incisos I e III, verificamos a necessidade de processos de aprendizagem que fomentem a capacidade de aprender (leitura, escrita e cálculo) tendo em vista a construcao do conhecimento, de habilidades e de atitudes do alunado. Na insercao do educando no mundo das linguagens e dos processos de raciocínio lógico-matemático, possibilita-se que ele se constitua como sujeito que le e interpreta o mundo na medida em que se (re)faz como ser ético no mundo da vida.

Segundo, o movimento da relacao escola, professor, aluno e conhecimento, no ambito do Ensino Fundamental, permite aos sujeitos aprendentes a efetividade do que apontam os incisos II e IV: a compreensao da sociedade a partir da formagao humana e da insergao na vida social (IV). Em suma, “o individuo da espécie humana nao se torna homem a nao ser que se integre num grupo que lhe ensine a cultura e preencha a distancia entre o cérebro e o ambiente” (NÓVOA, 1991, p. 109).

Na compreensao de Canário (2006), a instituigáo escolar no contexto do século XX se constituí a partir de tres modelos: a escola das certezas, a escola daspromessas e a escola das incertezas. Segundo esse autor (2006), a escola das certezas corresponde á primeira metade do século XX no contexto da “fabricado de cidadaos”, fornecendo os elementos para a divisao social do trabalho. Essa escola elitista permitia a alguns a ascensao social, permanecendo isenta na produgao das desigualdades sociais. Em suma, o educador portugués pontua que “a escola aparecia como uma instituigao justa, em um mundo injusto” (CANÁRIO, 2006, p. 16-17).

O momento histórico posterior á Segunda Guerra Mundial marca a transigao da escola das elites para a escola de massas e a correspondente mudanga da escola das certezas para a escola das promessas (CANÁRIO, 2006). Na compreensao de Formosinho (2009), a marca dessa escola de massas é a heterogeneidade “[...] essencialmente [...] na dimensao humana - maior heterogeneidade discente, maior heterogeneidade do corpo docente, mais heterogeneidade contextual, isto é, das comunidades locais onde a escola se insere” (p. 39). Aqui é possível perceber a expansao das redes de ensino de forma otimista em busca de “mais escolas” para dar conta de tres promessas fundamentais: o desenvolvimento, a mobilidade social e a igualdade (CANÁRIO, 2006).

Mediante essas promessas, instaura-se o movimento de transigao do otimismo dos anos 1950 e 1960 para o desencanto da década de 1970. Neste período, as teorias crítico-reprodutivistas, a partir dos estudos da sociologia da educagao, apontam a escola como responsável pelas desigualdades sociais no contexto das contradigoes do capital. Segundo Canário (2006), “paradoxalmente, a democratizagao da escola comprometeu-a com a produgao de desigualdades sociais, o que fez com que ela tivesse de ser vista como uma instituigao justa em uma sociedade injusta, tendo passado a acentuar níveis de frustragao e desenvolvimento que marcam a sua entrada em uma era de incertezas” (p. 17).

Na concepgao freireana de formagao é possível verificar o permanente movimento do ensinar pelo aprender na medida em que o educador é também educando e vice-e-versa. Logo, a formagao é um continuum e nao um momento estanque. Concebendo que o processo da formagao inicial precisa dar conta dos saberes fundantes da profissao docente (TARDIF, 2002; GAUTHIER, 1998), defendemos neste projeto, concordando com Lima (2001), uma

[...] formacao continua ligada ao desenvolvimento profissional no horizonte da emancipacao humana. Dessa forma, proponho um conceito de formacao contínua como a art.iculag.ao entre o trabalho docente, o conhecimento e o desenvolvimento profissional do professor, como possibilidade de postura reflexiva dinamizada pela práxis (p. 49 - grifos da autora)

Neste sentido, a essa compreensao dialética e dialógica de formacao segundo a

ótica da Pedagogía Freireana (1996) e á formacao continua assentada no trabalho

docente, no conhecimento e no desenvolvimento profissional assentado na práxis

discutida por Lima (2001), estao a elas associadas á formagao continuada e em servigo

já anunciadas pelo PME (2015) anteriormente. De um lado,

A formacao continuada de professores, nesse sentido, passa a ser encarada como uma ferramenta que auxilia os educadores no processo de ensino-aprendizagem de seus alunos, na busca de novos conhecimentos teórico-metodológicos para o desenvolvimento profissional e a transformacao de suas práticas pedagógicas. Nesse sentido, a escola, como instituicao educacional e como espaco de formacao continuada dos professores, precisa proporcionar recursos e tempo para que os educadores possam compreender sua própria realidade institucional, analisá-la e, consequentemente, transformá-la (ALVORADO-PRADA; FREITAS e FREITAS, 2010, p. 374).

De outro lado, “a formacao concomitante ao exercício do oficio inaugura [...] uma nova racionalizacao da profissionalidade, e, por extensao, da constituicao dos saberes docentes” (AQUINO; MUSSI, 2001, p. 216). Isso faz sentido quando pensamos que o lócus do trabalho docente traz a efervescencia de suas demandas particulares. No entanto, nao se pode perder de vista que o local estabelece a relacao dialética com o global e vice-e-versa. O global antes de tudo é local no ámbito da complexidade (MORIN, 2005[3]; SANTOS, 2008). Em outras palavras, na formacao em servico damos conta das necessidades do microespaco da escola sem desarticulá-las das proposicoes macrossociais da formacao de professores da rede municipal, estadual e do Sistema brasileiro educacao. Dessa forma,

Pode-se afirmar que, a principio, o objetivo principal desse novo modelo regulador da formacao - a formacao em servico - foi o de funcionar como uma espécie de ‘corretivo' das práticas docentes (FUSARI, 1988)[4]. O efeito ensejado, presume-se, seria o de promover uma certa homogeneizacao, dessa vez mais controlada, das condutas cotidianas dos professores (AQUINO; MUSSI, 2001, p. 217).

Neste sentido, é possível pensar apráticapedagógica orientada pela teoría que a ressignifica e lhe dá novos contornos no bojo da interculturalidade e da dialogicidade entre os sujeitos aprendentes. Portanto, pensar a escola no bojo da Comunidade de Aprendizagem como espago de formagao continuada, continua e em servido é buscar a corregao de fissuras criadas pelas dicotomias da ciencia moderna. Logo, a teoria é a lente de aumento para enxergar o real na tentativa de descreve-lo e dar-lhe significados no mesmo movimento em que a prática é o lócus de producao de saberes que mobilizam situagoes de humanizagao dos sujeitos aprendentes, com vistas á elaboragao de uma racionalidade pedagógica. Segundo Therrien (2006),

A racionalidade pedagógica é inconcebível fora do contexto da epistemologia da prática. Ela é o suporte de uma práxis educativa como processo de reflexao sistemática sobre a agao por parte de sujeitos, social e coletivamente, voltados para a construgao de conhecimentos e saberes que refletem os significados e sentidos num horizonte de transformagao do mundo da vida com emancipagao social. (p. 77-78)

Nesse processo formativo, compreendemos que a construgao do conhecimento na formagao continuada, continua e em servigo parte da ideia de que “entre a ignorancia absoluta e o saber absoluto, há lugar para o conhecimento e para o progresso dos conhecimentos” (COMTE-SPONVILLE, 2002, p. 64). Nao é possivel pensar o conhecimento e o saber acabado, pois o real e o homem sao devir, movimento, continuidade. No vértice da relatividade do saber absoluto e da ignorancia absoluta há espago para os sujeitos aprendentes conhecerem o mundo para melhor conhecerem o seu mundo a fim de constantemente ressignificá-lo.

METODOLOGIA

Partindo da ideia de que a ciencia seja a busca da veracidade dos fatos de forma verificável, a pesquisa passa a ser o alvo da própria ciencia. Mostra-se, pois, de vital importancia para as ciencias sociais a pesquisa social. Respaldando essa afirmativa, tem-se em Marconi e Lakatos que “a pesquisa tem importancia fundamental no campo das ciencias sociais, principalmente na obtengao de solugoes para problemas coletivos” (p.18). A pesquisa social é definida por Gil (1999) como

(...) o processo formal e sistemático de desenvolvimento do método cientifico. O objetivo fundamental da pesquisa é descobrir respostas para problemas mediante o emprego de procedimentos cientificos. A partir dessa conceituagao, pode-se, portanto, definir pesquisa social como o processo que, utilizando a metodologia cientifica, permite a obtengao de novos conhecimentos no campo da realidade social”. (p.42).

Acreditamos que cada pesquisa social terá um objetivo específico. Assim, há a

classificagao das pesquisas em tres níveis: pesquisas exploratórias, pesquisas descritivas e pesquisas explicativas. As pesquisas exploratórias serviriam, em apertada síntese, para um primeiro conhecimento de temas e fatos menos estudados e menos conhecidos. Seria uma etapa inicial para um posterior aprofundamento temático. Pesquisas descritivas servem para encontrar e descrever características de certa populagao. Gil explica que “sao inúmeros os estudos que podem ser classificados sob este título e uma de suas características mais significativas está na utilizagao de técnicas padronizadas de coletas de dados”. (p.44). As pesquisas explicativas seriam as mais complexas, e tentariam encontrar fatores que favorecem a ocorrencia de fenómenos e se valeriam basilarmente do método experimental. Para qualquer que seja o nível de pesquisa ou sua finalidade, é necessário um preparo para a sua realizagao. Podemos dizer que nossa pesquisa se utilizou dos tres níveis de pesquisa, que se distribuíram em etapas diferentes.

Em um primeiro momento, estudamos a proposta da formagao no bojo da Escola da Terra. Juntamos uma bibliografia que abordasse os temas: formagao de professores no ámbito da educagao básica; relagao teoria/prática: peculiaridades da escola pública brasileira; posteriormente, realizamos um estudo dos sujeitos-alvo de nossa pesquisa, coletando informagoes sobre a formagao académica e área de atuagao no ámbito da educagao; e, finalmente, já com os dados coletados, buscamos explicar algumas características dos sujeitos envolvidos na prática de formagao de professores.

Segundo Marconi e Lakatos, sao vários os procedimentos de coleta de dados. Em linhas gerais, temos: coleta documental; observagao; entrevista; questionário; formulário; medidas de opinioes e atitudes; técnicas mercadológicas; testes; sociometria; análise de conteúdo; história de vida.

Como técnica para chegar até os sujeitos envolvidos na pesquisa, utilizamos o questionário. O questionário, segundo Gil (1999, p.128), pode ser definido “como a técnica de investigagao composta por um número mais ou menos elevado de questoes apresentadas por escrito ás pessoas, tendo por objetivo o conhecimento de opinioes, crengas, sentimentos, interesses, expectativas, situagoes vivenciadas etc.”. Assim, nas questoes de cunho empírico, é o questionário uma técnica que servirá para coletar as informagoes da realidade, tanto do empreendimento quanto do mercado que o cerca, e que serao basilares na construgao do TCC.

Utilizamos perguntas fechadas, com alternativas específicas para que o informante pudesse escolher uma delas. No próximo item, trazemos os dados coletados seguidos de suas análises.

ANÁLISE DOS DADOS

A pesquisa foi realizada com a aplicagao de um questionário a quatorze pessoas, dentre elas onze professores, um gestor escolar e um coordenador pedagógico. Todos os participantes possuem curso superior: tres graduados em História, seis em pedagogía, tres em língua portuguesa, um em química e outro em biologia.

Os participantes desempenham suas fungoes em duas escolas localizadas no municipio de Tururu, no estado do Ceará: Escola Municipal de Ensino Fundamental Caetano José da Costa e Centro Educacional Patrícia Mota de Freitas.

A escola Caetano José da Costa está localizada em uma regiao que possui uma presenga histórica quilombola. As casas sao cortadas por uma longa avenida de terra de batida. Há uma escola e uma creche, que servem também aos povoados vizinhos. Há aproximadamente 230 famílias que vivem basicamente da agricultura de subsistencia. Deste total, estima-se que em torno de 20% sejam de quilombolas puros. O restante tem descendencia quilombola, mas é fruto de casamentos de negros com brancos ou pardos vindos de outras partes. As misturas comegaram a ocorrer em meados dos anos 70, com a migragao de moradores para a Capital e a consequente venda de propriedades. Conceigao dos Caetanos é uma das 16 comunidades reconhecidas pelo Incra no Ceará. A escola Patrícia Mota de Freitas está localizada no bairro Novo Horizonte, no município de Tururu. A escola disponibiliza vagas em todos os anos do ensino fundamental.

O questionário aplicado foi composto por dez questoes, sendo as duas primeiras referentes á titulagao, área de atuagao e a cursos de formagao continuada já realizados pelos sujeitos. No que diz respeito ás perguntas sobre formagao e área de atuagao, os dados já foram divulgados em parágrafos anteriores.

Todos os participantes já realizaram pelo menos uma formagao continuada. Sabemos que o professor dos anos iniciais se forma através de um processo dinámico de interagoes e experiencias, no qual os saberes sao construídos, seja para resolver problemas na sua prática pedagógica seja para organizá-la. Na construgao destes saberes o professor aprende a profissao de educador. A esse respeito afirma Sousa (2008, p. 66) “[...] ser docente um profissional implica, portanto dominar uma série de saberes,

capacidades e habilidades especializadas que o fazem competente no exercício da

docencia.” Assim, a formagao continuada apresenta-se como fator relevante para uma atuagao repleta de significagao, possibilitando ao educador maior aprofundamento dos conhecimentos profissionais, adequando sua formagao as exigencias do ato de ensinar, levando-os a reestruturar e aprofundar conhecimentos adquiridos na formagao inicial. O professor que participa de atividades de formagao continuada pode refletir sobre suas práticas e trabalho diário. Conforme exposto por Adauto Lopes da Silva Filho e Fátima Maria Nobre Lopes[5]

Para Adorno a figura do professor nessa missao é central. É preciso que saiba analisar o seu papel e tenha um amplo conhecimento da situagao social eeducacional, libertando-se de tabus, dogmas e acomodagoes. Aqui urge anecessidade de uma boa formagao inicial e continuada do professor, pois, seassim o for, a boa formagao irá auxiliar tanto para a compreensao da realidade, onde se insere o professor, como para a formagao da sua consciencia crítica. Só assim é possível superar a razao instrumental, gerada pelas ciencias positivas a servigo da tecnocracia burguesa.

No que diz respeito ás formagoes continuadas, todos os participantes da pesquisa afirmaram que elas contribuem para a sua prática pedagógica. As formagoes continuadas Escola da Terra, Mais PAIC, PROFA e Proletramento foram sinalizadas como importantes para a própria formagao profissional.

Nessa perspectiva, a formagao continuada possibilita ao docente a aquisigao de

conhecimentos específicos da profissao, tornando-se assim um profissional mais

capacitado para atender ás exigencias impostas pela sociedade, exigencias estas que se

modificam com o passar dos tempos, tendo entao o educador que estar constantemente

atualizado. Pois, conforme, Sousa (2008, p.42):

Ser professor, hoje, significa nao somente ensinar determinados conteúdos, mas, sobretudo, um ser educador comprometido com as transformagoes da sociedade, oportunizando aos alunos o exercício dos direitos básicos á cidadania.

Vemos que os participantes da pesquisa buscam uma permanente atualizagao no que diz respeito aos conhecimentos necessários para a prática pedagógica. A dicotomia teoria/prática, que poderia estar presente na aversao a formagoes continuadas, nao é vista, tomando por base as respostas dadas pelos professores.

Mais do que nunca, o educador deve estar sempre atualizado e bem informado,

nao apenas em relagao aos fatos e acontecimentos do mundo, mas, principalmente, em relagao aos conhecimentos curriculares e pedagógicos e ás novas tendencias educacionais.

Em relagao á pergunta referente á formagao inicial como sendo suficiente para a prática pedagógica, nao houve consenso. Sete participantes consideram a formagao inicial como suficiente e outros sete julgam ser necessária a formagao continuada. Uma vez que todos os professores sinalizaram a importancia da formagao continuada para a sua prática pedagógica, tínhamos partido da hipótese de que todos considerariam a formagao inicial como insuficiente para toda a complexidade da prática pedagógica: nao foi o que ocorreu.

A formagao continuada de professores tem sido entendida como um processo permanente de aperfeigoamento dos saberes necessários á atividade profissional, realizado após a formagao inicial, com o objetivo de assegurar um ensino de melhor qualidade aos educandos.

No que diz respeito á possibilidade de haver uma formagao diferenciada para professores do campo e da cidade, também nao houve consenso. Sete participantes sinalizaram que deveria ser diferenciada enquanto a outra metade manifestou a opiniao de que deveria ser igual.

CONSIDERALES FINAIS

Diante do que foi discutido aqui, acreditamos que só é possível visualizar caminhos de enfrentamento das dificuldades oriundas das demandas sociais que deságuam na prática pedagógica cotidiana através da formagao e das melhorias das condigoes de trabalho do professor.

O resultado dessas agoes viabiliza caminhos para o desenvolvimento profissional docente, a aprendizagem significativa das criangas, e a expansao e qualificagao da rede municipal de ensino na esteira da emancipagao humana e do desenvolvimento económico, social, político, e ético em Tururu (GARCIA, 1999; FREIRE, 1996).

A profissao docente realiza-se em agoes práticas e exige fundamentagao teórica; para a construgao desta profissao é essencial a existencia de um “tripé da profissionalizagao”, ou seja, precisa haver uma formagao inicial sólida, formagao continuada de acordo com as exigencias da sociedade e uma carreira que atenta as expectativas do profissional, fazendo sentir-se realizado.

Hoje, tornar-se professor dá-se num processo dinámico de construgoes de significados referentes á educagao, ao ensino e á aprendizagem, destacando-se, neste processo, a importáncia da formagao inicial e continuada, articulada com a realidade sócio-educacional, fazendo com que o educador domine uma série de saberes, capacidades e habilidades que o tornam competente no exercício da docencia, podendo entao ser considerado profissional da educagao

Embora a formagao continuada deva atender ás necessidades do professor no seu cotidiano, ela nao pode ser entendida como um receituário, ou seja, um conjunto de modelos metodológicos e/ou lista de conteúdos que, se seguidos, serao a solugao para os problemas. Os processos de formagao continuada podem ser valiosíssimos, se conseguirem aproximar os pressupostos teóricos e a prática pedagógica. A formagao continuada deve ser capaz de conscientizar o professor de que teoria e prática sao “dois lados da mesma moeda”, que a teoria o ajuda a compreender melhor a sua prática e a lhe dar sentido e, consequentemente, que a prática proporciona melhor entendimento da teoria ou, ainda, revela a necessidade de nela fundamentar-se. Nesse sentido, é de suma importáncia que investimentos na área da formagao de professores, seja ela inicial ou continuada, sejam aplicados, também, no campo.

O descaso com a educagao dos povos do campo trouxe consequencias e deixou marcas constatadas, ainda hoje, na precariedade da oferta, no funcionamento das escolas do campo, no que se refere á inadequagao curricular, dos espagos e da estrutura física; indisponibilidade de pessoal qualificado especificamente para o trabalho pedagógico; baixa remuneragao dos professores; dificuldades de deslocamento, tanto dos alunos quanto dos docentes; escassas ou inexistentes oportunidades de formagao profissional docente, tanto a inicial quanto a continuada e tantas outras carencias. Nesse contexto, discutir a formagao de professores no ámbito do campo é de suma importáncia.

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Leia mais em: http://www.webartigos.com/artigos/a-importancia-da-formacao-continuada-para-uma-at uacao-docente-reflexiva-o-processo-formativo-e-o-desenvolvimento-profissional-de-pro fessores-das-series-iniciais-do-ensino-fundamental-basico/71685/#ixzz4nLBP0Yt5

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[1]    Antonio Cipriano José María y Francisco de Santa Ana Machado Ruiz, conhecido como Antonio

Machado (Sevilha, 26 de julho de 1875 — Collioure, Franga, 22 de fevereiro de 1939) foi um poeta

espanhol, pertencente ao Modernismo.

[2]   “A atividade prática material, e particularmente o trabalho, era considerada no mundo grego e romano

como uma atividade indigna dos homens livres e própria dos escravos. Ao mesmo tempo em que se

rebaixava a atividade material, manual, exaltava-se a atividade contemplativa, intelectual” (VÁZQUEZ,

2011, p. 39)

[3]  “De toda parte surge a necessidade de um principio de explicacao mais rico do que o principio de simplificacao (separacao/ reducao), que podemos denominar principio de complexidade. É certo que ele se baseia na necessidade de distinguir e de analisar, como o precedente, mas, além disso, procura estabelecer a comunicacao entre aquilo que é distinguido: o objeto e o ambiente, a coisa observada e o seu observador” (MORIN, 2005, p. 30)

[4] FUSARI, José C. Formacao contínua de educadores: um estudo de representacoes de coordenadores pedagógicos da Secretaria Municipal de Educacao de Sao Paulo (SMESP). Sao Paulo; 1997. Tese (Doutorado) - Faculdade de Educacao, Universidade de Sao Paulo.

[5]      Em Trabalho, Educagao e Emancipagao, trabalho publicado na obra Escola da terra ceará: Conhecimentos Formativos para a Práxis Docente do/no Campo.